O impacto do assédio moral sobre a saúde de servidores e magistrados foi o destaque do primeiro dia do 2º Seminário Nacional sobre a Saúde dos Magistrados e Servidores do Poder Judiciário, realizado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ). De acordo com o ministro do Tribunal Superior do Trabalho (TST) Cláudio Brandão, é preciso criar e manter um ambiente de trabalho mais positivo, para evitar a pressão exagerada sobre os trabalhadores, exigindo metas inatingíveis, e a difamação.
“De que maneira o juiz exerce o seu poder?”, questionou o ministro ao iniciar a palestra “O Assédio Moral no Poder Judiciário”, que abriu os trabalhos do 2º Seminário nesta quarta-feira (04). Brandão ressaltou que muitas situações causam constrangimento no local de trabalho, gerando uma pressão competitiva, que nem sempre é positiva.
Ele ressaltou que o Poder Judiciário segue as metas criadas pelo CNJ, desenvolvidas para mensurar o trabalho realizado no Brasil, mas, a fim de alcançar esses objetivos, desenvolve-se também o estresse ocupacional, com pressão exagerada sobre o funcionário. Essa pressão pode levar a pessoa que não consegue cumprir as metas à exclusão do grupo, ou mesmo criar uma situação de perseguição, o que já pode ser reconhecido como assédio moral.
“A depressão é a doença que mais afeta a população mundial e pode causar danos irreversíveis. O objetivo do CNJ ao trazer esse tema para a abertura deste evento é desenvolver estratégias para conhecer o problema e combatê-lo”, explicou o ministro. De acordo com ele, o Brasil começou a identificar o assédio moral no trabalho apenas no ano 2000. Antes disso, a jurisprudência registrou sentenças contra dano moral pelo Supremo Tribunal Federal (STF), em 1966; o Superior Tribunal de Justiça (STJ) começou a julgar questões relativas a dano moral em 1980; e a Justiça do Trabalho, a partir da década de 1990.
Para manter um ambiente saudável e seguro, é preciso cuidar das relações interpessoais. “Combatamos tenazmente a fofoca no ambiente de trabalho, com o objetivo de evitar problemas que possam se desenvolver para a difamação e o assédio”, reforçou o ministro. Além disso, ao estabelecer objetivos inatingíveis, a liderança pode levar os funcionários a desrespeitarem a ética e o respeito ao próximo. Ele lembrou que é preciso respeitar o “direito de desconexão” das pessoas. “A comunicação instantânea nos trouxe uma ferramenta para facilitar o trabalho. Mas, quando exageramos e enviamos uma mensagem ao funcionário de madrugada, ainda que não seja nossa intenção de sobrecarregá-lo, ele pode se sentir na obrigação de responder, por medo da autoridade. E esse é o problema”, explicou.
Como reflexão, o ministro apresentou a campanha do TST sobre assédio moral, chamada de “Pare e Repare”, que trata da conscientização e prevenção ao assédio moral, tanto nos aspectos vertical (da chefia aos servidor) e horizontal (entre os servidores), quanto no institucional. “Temos que observar a sedução do poder. O juiz precisa estabelecer limites, pois é um potencial assediador, se não levar em consideração as pessoas que contribuem com seu trabalho. De nada adianta uma bela decisão se ela não for executada. O funcionário é a parte operacional e precisa ser valorizado”, afirmou.
O também ministro do TST e conselheiro do CNJ Aloysio Corrêa da Veiga, que mediou a mesa, disse que o Conselho está buscando boas práticas para o aperfeiçoamento da Justiça. Para ele, o trabalho pela saúde dos servidores e magistrados é fruto dessa preocupação, que aponta métodos de trabalho para um ambiente mais saudável. “Queremos criar um ambiente para troca de experiências e benchmarking, buscando boas práticas que possam ser replicadas. O CNJ tem se dedicado à área de políticas públicas, adotando medidas capazes de melhorar o tempo no Poder Judiciário”.
Saúde mental
No último painel, a professora da UnB Ana Magnólia destacou alguns dados de sua pesquisa que apontou um número crescente de suicídios no ambiente de trabalho ou motivados por problemas relacionados ao trabalho. De acordo com ela, o sofrimento é uma das principais questões apontadas pelos mais de 6 mil servidores que participaram do levantamento.
O modelo gerencialista aplicado aos ambientes de trabalho tem sido um fator preocupante, pois registra uma desumanização no trato dos servidores e a aplicação de metas exageradas. De acordo com a pesquisa, 71% dos trabalhadores sofrem de esgotamento mental; e 45% relataram tristeza e vontade de desistir de tudo. “O sistema está em estado de alerta. Alguns caminhos precisam ser alterados para que esse cenário não piore”, ressaltou.
De acordo com Ana Magnólia, o medo é o principal sintoma citado: medo de errar, de ser excluído porque errou, de ser chamado de incompetente e de ser punido. “As relações de confiança estão quebradas. O assédio moral é um dos principais causadores desse quadro. A pesquisa é importante para termos um processo de discussão”, alertou.
O conselheiro Valtércio Oliveira mediou a mesa e compartilhou sua experiência com assédio moral, quando foi servidor. Ele relatou que tinha sentimentos de perseguição e teve sequelas físicas decorrentes do estresse vivido. “O que fazer para evitar a tragédia do suicídio dos colegas? O que podemos reforçar é que seja mantido um clima de amorosidade nas varas, seções e tribunais”, disse.
Fonte: CNJ, editado por Caroline P. Colombo